Estou assistindo à Reality Z, nova série nacional
da Netflix e resolvi dar meu parecer do episódio 1:
Antes de continuar ja vou dizendo que esse texto contém spoilers!
A proposta é interessante. Sou muito fã de temática
zumbi, então já tem meu total apoio. Apesar que acho q a proposta talvez fosse
melhor trabalhada em forma de comédia, a Netflix apostou na ideia de um drama.
Quero começar com a atuação dos participantes do
reality Show. Meu professor de teatro costumava dizer que teatro é uma
convenção. Os atores estão representando os personagens e o público se permite
ser enganado. Ou seja, quando assistimos a um filme, nós sabemos que os atores
ali não são aqueles personagens, mas permitimos acreditar que são para fazer o
entretenimento fluir. Contudo, se o ator não se entrega para ser o mais
verossímil possível, a gente que está assistindo sente-se enganado.
E ao ver a atuação dos participantes do Reality
show dentro da série, eu me senti enganado. Eu não via participantes do reality
show. Eu via atores fingindo que são participantes. Os diálogos não ajudam
também. Um esperando o outro terminar sua fala para depois ele falar. Se é um
reality show em que supostamente são pessoas reais ali, eu quero ser convencido
que são pessoas reais ali dentro. E quando pessoas reais conversam, mesmo em um
reality show, elas não esperam o outro terminar sua frase bonitinho para falar o
que tem para falar. E foi o que aconteceu. No núcleo do Reality show não
convence que é um reality show.
Os efeitos estão satisfatórios. A maquiagem de
zumbis também. Lembra um pouco filmes de zumbis mais antigos, o que pode ser
positivo ou negativo para quem assiste. Por um lado agrada os gostos mais
nostálgicos. Por outro pode desagradar quem espera uma produção no nível The
Walking Dead.
Algumas transições de cenas são boas. Um exemplo
está logo após aparecer o primeiro zumbi. Uma equipe da TV está dirigindo pela
estrada quando veem um acidente. Eles param o carro e o motorista vai verificar
o que houve. Ao dar a volta no veículo ele encontra um homem morto e uma mulher
zumbi devorando o corpo. A mulher olha para o motorista e grita. Logo em
seguida corta para uma multidão em frente à emissora de TV esperando o
participante eliminado do Reality show sair. Isso é bom porque cria suspense e
tensão. A gente acabou de ver um zumbi e logo em seguida vê uma multidão
amontoada nas portas da emissora. De cara a gente já antecipa e sente a tensão:
Imagina tudo isso de zumbis. A transição da cena cria a tensão no espectador.
O roteiro trabalha até que bem o subtexto em alguns
momentos. Em outros coloca falas desnecessárias. Um exemplo positivo acontece
quando um deputado, no meio do caos solicita a uma viatura da polícia que o
leve em segurança. Os policiais recusam, o deputado mostra a maleta cheia de
dinheiro, os policiais ficam impressionados, acenam e o deputado e a assessora
entram no carro. Assim que entram, a assessora olha para trás, vê uma mulher
negra, faz um gesto para o deputado que, ao ver a mulher negra também faz cara
de nojo.
Tudo isso é subtexto bem trabalhado. Ninguém
precisa falar nada. A gente entende. A gente entende que o deputado estava
oferecendo o dinheiro. A reação dos policiais já mostra que eles aceitaram o
suborno. A reação da assessora e do deputado perante a mulher do banco de trás
já denuncia que eles são racistas. Ninguém precisou dizer “Eu te dou esse
dinheiro todo” ou “Olha tem uma negra no banco de trás”. Tudo isso está no
subtexto.
Um exemplo ruim acontece logo na cena seguinte.
Quando a equipe da TV está dirigindo o carro e o motorista (que em algumas
cenas atrás foi ver um acidente e encontrou um zumbi) está sangrando. A mulher
no banco com ele grita “Ela mordeu ele!”. Isso é um exemplo de diálogo
desnecessário que poderia ter um subtexto. A gente já tinha visto a cena dele
encontrando uma zumbi, logo, nós já deduzimos que o sangue no pescoço do
motorista é devido à mordida dela.
Nesse caso, ao falar “Ela mordeu ele” o roteiro
está usando um personagem para “explicar” ao publico o que aconteceu. E isso,
além de demonstrar insegurança do roteirista, passa a impressão que o público é
burro e não entendeu uma coisa obvia.
Os personagens do Brandão (Guilherme Weber) e Divina
(Sabrina sato) são os mais unidimensionais até agora. Você percebe de cara que
eles são egoístas e só pensam no dinheiro e fama. E eles agem como egoístas que
só pensam no dinheiro e fama. Há um momento na atuação de Brandão que foi
difícil assistir. Esse momento é quando ele está fugindo de um zumbi e encontra
um cadeirante no banheiro. Ele coloca o cadeirante entre ele e o zumbi. Ok...
isso condiz com seu personagem egoísta. Única informação “nova” é que ele é tão
egoísta que sacrifica a própria equipe e não tem pena nem de um cadeirante na
hora de sobreviver. O que não precisava era o personagem ficar dizendo “Pega ele!
Morde ele!”. De novo, diálogo desnecessário.
Sinceramente detestei a atuação da Sabrina Sato que
só foi boa como apresentadora, mas na hora de mostrar a personagem fora das
câmeras... Não se entregou. Quando ela foi mordida só faltou dizer “Morri”
antes de tombar para o lado com uma corporeidade que não pareceu de alguém que morrendo.
Há alguns momentos que salva na questão do terror. Um
desses momentos acontece no dia seguinte após o surto em que os participantes
isolados do reality show estão tomando café da manhã e nós, o público, vemos o
outro lado do vidro cheio de sangue. Outro momento de tensão. A gente sabe que
ta todo mundo morto do outro lado, mas as pessoas dentro do reality não
conseguem saber por que eles não conseguem ver através do vidro opaco.
O arco da nina (Ana Hartmann) é interessante e move
a trama. Ela tem um objetivo claro: Sair da emissora. Ela tenta, falha, volta
para dentro. Seu arco dramático do inicio da série (relacionamento a três e vídeo
vazado na internet) poderia ser melhor explorado, mas serviu para mostrar um
pouco do caráter superficial da personagem: Ela gosta do que fez, pediu para
filmar, mas não gosta de ter o vídeo exposto.
Contudo, a maneira como os participantes isolados
percebem que tem algo errado é convincente. Eles acordam, percebem que não houve
recado mas ignoram. “Devem estar respeitando a ressaca”. Então um participante
decide sair e não é atendido. Uma outra passa meia hora sem o microfone e não é
penalizada. Só então eles percebem que tem algo errado. Estão ali a dois meses
e isso não é normal. Inicialmente eles consideram que faz parte do programa, ao
invés de presumir tudo de cara.
Essas duas tramas se juntam no final do episódio,
quando Nina, fugindo dos zumbis, entra no lugar onde os participantes estão
confinados. E a primeira reação deles é pensar que ela é uma nova participante.
Por um lado é legal que eles não tenham percebido de imediato. Mas por outro,
não seria comum as pessoas reagirem assim quando uma mulher ensanguentada com
uma tesoura gigante nas mãos entra num local confinado. A primeira coisa que
qualquer um pensaria é simples: Essa louca matou geral la fora e veio aqui
matar a gente também.
Eu diminuiria a cena final, cortando logo após a
protagonista se encontrar com os participantes do reality show. A parte em que
eles acham que ela é uma nova participante poderia ter deixado para o episódio
seguinte. Ia combinar mais com a série e seria um final mais dramático. Ao
colocar os participantes comemorando como alienados, quebra a tensão que o
episódio estava construindo na sequencia final.
A proposta da série é legal, mas podia melhorar. Com
exceção da protagonista e de algum outro membro do elenco, as atuações de quase
todos podia melhorar, ou o diretor podia exigir mais dos atores. Falta subtexto
no roteiro e alguns diálogos são desnecessários. Tirando uma ou outra situação,
boa parte dos momentos do episódio 1 é verossímil. Um ponto positivo é que a
trama soube criar tensão no expectador.
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